Nem todos os artistas estão pela extinção sumária da Lei Rouanet.
Se os que agora se organizam em torno de uma cooperativa se dizem em busca de um diálogo honesto e democrático, então que ouçam as pessoas, os artistas que não estão na Lei do Fomento, não são da cooperativa e não formam com eles o bloco único, monolito consonante de “trabalhadores do teatro”.
Eu discordo da afirmativa de que os grupos auto-intitulados “trabalhadores do teatro” fomentados, numa referência e reforço a um recalque social, do trabalhador por oposição ao vagabundo, promovem necessariamente democracia no âmbito da produção artística no Brasil.
A carta atribuída a estes trabalhadores critica o mercantilismo nas artes, a ingerência do marketing na seleção de projetos, mas não critica a seletividade corporativista ideologizante da Lei do Fomento paulista. Fala em roubo e em omissão do governante perante a iniciativa empresarial mas não vê que a classe empresarial não é o inimigo, e que o artista tem muito que reaprender com esse segmento, que ajudou a construir enquanto a arte orientava a produção e a pesquisa empresarial/industrial de uma época.
Falam como criança mimada que não tem responsabilidade e só sabe fazer exigências, negando-se a olhar a sociedade como um todo, como produto daquilo que se é, e que se faz.
A Lei Rouanet do jeito que está é macro clientelista, favorece, estatisticamente sempre as mesmas situações artísticas em detrimento de outras; isso deve mudar, mas sempre alguém vai preferir alguma coisa e preterir outra, deixando esta outra no pretérito. Por isso, a necessidade da pluralidade de mecanismos e a diversidade de pessoas que escolhem os projetos a contemplar, no âmbito do governo e das empresas.
Um fomento no âmbito Federal, nos moldes do que ocorre hoje na cidade de São Paulo, micro clientelista nominal e intermediado por um único órgão representativo, a Cooperativa de Teatro, pode se tornar ainda muito mais tirânico do que a escolha pautada pelos interesses das empresas. Essa é a temeridade de se tirar uma lei que existe: a substituição por um sistema mais estatizante e paternalista, coisas que não tem nada a ver com arte.
Acredito que a discussão deveria passar também e principalmente pelo indivíduo que faz arte, pelo patrocínio a pessoas no tempo, não somente para projetos específicos.
A arte é plural e diferente assim como as pessoas tem diferenças. Isto é um fato anterior a qualquer mecanismo de Estado. Se queremos, de fato encontrar esta pluralidade no Ministério da Cultura é preciso lutar por uma pluralidade de mecanismos, que quanto mais forem, maior será a diversidade dos projetos patrocinados, ao limite de, com uma única Lei regulamentando a verba, haver uma infinidade de mecanismos, um para cada projeto específico. Isso seria o ideal, que o mecanismo de apoio fosse tão sofisticado que se desdobrasse em muitos, em tantos mecanismos quantos forem os projetos.
Sou artista e individualista, acredito que quem inicia as transformações é o indivíduo na sua tomada de decisão que só ele pode saber, através do gesto pessoal artístico, o traçado de cada artista.
Não nego e conheço os principais acontecimentos que levaram à criação do Fomento para o teatro em São Paulo e garantiram a sua continuidade através de governos sucessivos. Não nego que o teatro se faz em grupo, e conta com diversos artistas, profissionais ou não, desde a dramaturgia até a montagem; que arte é dedicação. Afirmo também o trabalho continuado como única via para o aprofundamento das produções nas artes. Mas não engrosso o coro dos que vem aqui dizer que o que todos nós queremos é a mesma coisa.
Não vamos regulamentar a profissão de artista.
O artista é um pesquisador, e parafraseando Duchamp, seu capital é o tempo. Dê-lhe tempo e ele realizará diversas atividades.
UM ARTISTA.
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CARTA ABERTA AO MINISTÉRIO DA CULTURA
Hoje, no Dia Mundial do Teatro, nós, trabalhadores de grupos teatrais de São Paulo organizados no Movimento 27 de Março, somos obrigados a ocupar as dependências da Funarte na cidade. A atitude extrema é provocada pelo falso diálogo proposto pelo governo federal, que teima em nos usar num debate de mão única. Cobramos, ao contrário, o diálogo honesto e democrático que nos tem sido negado.
O governo impõe um único programa: a transferência de recursos públicos para o marketing privado, o que não contempla a cultura mas grandes empresas que não fazem cultura. E se recusa, sistematicamente, a discutir qualquer outra alternativa.
Trocando em miúdos.
O Profic – Programa de Fomento e Incentivo à Cultura, que Vv. Ss. apresentam para discussão como substituto ao Pronac, que já existe, sustenta-se sobre a mesma coisa: Fundo Nacional de Cultura – FNC, patrocínios privados com dinheiro público (o tal incentivo/renúncia fiscal que todos conhecem como Lei Rouanet) e Ficart – Fundo de Investimento Cultural e Artístico.
Ora, o Fundo não é um programa, é um instrumento contábil para a ação dos governos. Já o Ficart (um fundo de aplicação financeira) e o incentivo fiscal destinam-se ao mercado, não à cultura. O escândalo maior está na manutenção da renúncia/incentivo fiscal, a chamada Lei Rouanet, que o governo, empresas e mídia teimam em defender e manter.
O que é a renúncia ou incentivo fiscal? É Imposto de Renda, dinheiro público que o governo entrega aos gerentes de marketing das grandes empresas. Destina-se ao marketing das mesmas e não à cultura. É o discurso que atrela a cultura ao mercado que permite esse desvio absurdo: o dinheiro público vai para o negócio privado que não produz cultura e o governo transfere suas funções para o gerente da grande corporação. Diminuir a porcentagem dessa transferência ou criar normas pretensamente moralizadoras não muda a natureza do roubo e da omissão do governante no exercício de suas obrigações constitucionais. Não se trata de maquiar a Lei Rouanet (incentivo fiscal); trata-se de acabar com ela em nome da cultura, do direito e do interesse público, garantindo-se que o mesmo dinheiro seja aplicado diretamente na cultura de forma pública e democrática.
Assim, dentro do Profic, apenas a renúncia fiscal pode se apresentar como programa, um programa de transferência de recursos públicos para o marketing privado, em nome do incentivo ao mercado. Trata-se, portanto, de um programa único que não vê e não permite outra saída, daí ser totalitário, autoritário, anti-democrático na sua essência.
E é o mesmo e velho programa que teima em mercantilizar, em transformar em mercadoria todas as atividades humanas, inclusive a cultura, a saúde e a educação, por exemplo. Não é por acaso que os mesmos gestores do capital ocupam os lugares chaves na máquina estatal da União, dos Estados e Municípios, coisas que conhecemos bem de perto em nosso Estado e capital, seus pretensos opositores.
E esse discurso único não se impõe apenas à política cultural. É ele que confunde uma política para a agrícultura com dinheiro para o agronegócio; que centra a política urbana na construção habitacional a cargo das grandes construtoras; e outra coisa não fazem os gestores do Banco Central que não seja garantir o lucro dos bancos. Não há saída, não há outra alternativa, os senhores continuam dizendo, mesmo com o mercado falido, com a crise do capital obrigando-os a raspar o Tesouro Público no mundo todo para salvar a tal competência mercantil.
Pois bem, senhores, apesar do mercado, nós existimos. Somos nós que fazemos teatro, mas estamos condenados: não queremos e não podemos fabricar lucros. Não é essa a nossa função, não é esse o papel do teatro ou da cultura. Nós produzimos linguagens, alimentamos o imaginário e sonhos do que muitos chamam de povo ou nação; nós trabalhamos com o humano e a construção da humanidade. E isso não cabe em seu estreito mundo mercantil, em sua Lei Rouanet e seu programa único.
Nós somos a prova de que outro conceito de produtividade existe. Os senhores continuarão a tratar o Estado e a coisa pública apenas como assuntos privados e mercantis? Continuarão a negar nosso trabalho e existência? Continuarão a negar a arte ou a cultura que não se resumem a produtos de consumo?
Por isso, além do FNC, exigimos uma política pública para a cultura que contemple vários programas (e não um único discurso mercantil), com recursos orçamentários e regras democráticas, estabelecidos em lei como política de Estado para que todos os governos cumpram seu papel de Poder Executivo.
É esse diálogo que os Senhores se negam, sistematicamente, a fazer enquanto se dizem abertos ao debate. Debate do quê? Do incentivo fiscal. Mas nos recusamos a compartilhar qualquer discussão para maquiar a fraude chamada Lei Rouanet.
Queremos discutir o Fundo. Mas queremos, também, discutir outros programas e oferecemos, novamente, o projeto de criação do Prêmio Teatro Brasileiro como um ponto de partida. Os Senhores estão abertos a este diálogo?
Movimento 27 de Março
São Paulo, Dia Mundial do Teatro e do Circo
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